Do CORREIO BRAZILIENSE – DF | CIDADES
A dificuldade para conseguir atendimento na rede pública de saúde do DF levou um TRAVESTI a atacar três funcionárias do Hospital Regional de Ceilândia (HRC) de forma violenta. Elas trabalhavam na ala de emergência da unidade quando se envolveram em uma confusão com Osmair Miliano Pinto, 28 anos, que se autointitula Maíra. Ontem, por volta das 12h30, ele acompanhava uma amiga que aguardava uma consulta há cerca de quatro horas, sem receber atenção da equipe médica. Furioso, ele anunciou que era portador do vírus HIV, invadiu um box da emergência, onde encontrou uma seringa e uma agulha e coletou cerca de 5ml do próprio sangue. Em seguida, saiu pelo corredor ameaçando pacientes e funcionários.
A primeira vítima foi a enfermeira-chefe do pronto-socorro do HRC, que não quis se identificar. A servidora, que atua há 27 anos no hospital, ouviu os gritos e recebeu a informação de que alguém estaria causando tumulto. Ao se aproximar de Osmair e perguntar como poderia ajudá-lo, o agressor cravou a agulha contaminada duas vezes em sua mão direita e chegou a injetar sangue em suas veias. A enfermeira conseguiu segurá-lo pelas mãos e uma auxiliar que acompanhou a confusão tentou imobilizar o TRAVESTIpelo pescoço. Levou uma mordida profunda no braço direito.
Uma terceira funcionária que passava pelo local, a auxiliar de enfermagem Lúcia Maria Silva de Souza, também tentou ajudar. Foi agredida com chutes na barriga e nas pernas. As vítimas conseguiram imobilizar Osmair, que foi levado à 15ª Delegacia de Polícia. O delegado-chefe, Onofre de Moares, explica que um segurança do hospital pôs fim ao tumulto.
A segunda mulher a ser agredida, que também preferiu não se identificar, relata que, após introduzir a agulha na mão da enfermeira-chefe, o TRAVESTI teria dito: “Agora, você faz parte do meu time”. Por terem entrado em contato direto com o sangue do agressor, as duas mulheres tomaram, ontem mesmo, a primeira dose de medicamentos anti-HIV, (1)jáque um teste rápido feito na delegacia confirmou que Osmair é mesmo SOROPOSITIVO. “É uma atitude repugnante”, afirma o delegado.
O TRAVESTI admite ter entrado “de boa, sem qualquer dificuldade” na enfermaria. “Minha amiga passou mal e exigi que ela fosse atendida. Houve negligência de todas as partes. Agi por impulso, mas não me arrependo”, protesta. Ele também não teve dificuldades em manusear a agulha, por já ter feito um curso de auxiliar de enfermagem em seu estado natal, Ceará. Estava em Brasília de passagem e viajaria para a casa dos pais em meados de julho.
A sequência de eventos que culminou na agressão no hospital começou na noite de domingo, por volta de 23h. Um grupo de amigas, incluindo Osmair, saiu à noite e varou a madrugada em várias casas noturnas. Uma colega admitiu que elas teriam usado álcool, drogas e que o agressor teria feito um programa. De manhã, eles decidiram nadar no Lago Paranoá e um dos travestis do grupo quase teria se afogado. Diante do mal-estar, os amigos teriam decidido seguir para o HRC.
A enfermeira-chefe, que sofreu a agressão mais grave, afirma que a equipe de funcionários do hospital está constantemente exposta a situações perigosas. Segundo ela, a superlotação dos serviços de saúde e o deficit de pessoal são os responsáveis pela revolta da população. “As complicações no atendimento dos hospitais de Taguatinga e de Samambaia aumentaram a nossa demanda”, avalia. Outra mudança que vem tumultuando o espaço é que a ordem de atendimento, antes feita com base na sequência de chegada, passou a ser realizada a partir da gravidade dos casos.
Segundo a diretora de Atenção à Saúde do HRC, Andréia Neri Ferreira, o hospital ainda abrirá sindicância para apurar os fatos. O processo levará em conta os depoimentos de funcionários e as imagens do circuito interno de segurança. “Se for o caso, haverá punição por negligência”, avisa. Ela afirma ainda que a enfermeira-chefe e a auxiliar de enfermagem que levou a mordida serão examinadas pelo Instituto Médico Legal (IML) e receberão acompanhamento psicológico. “Mas quando se age de imediato, o risco de contágio do vírus HIV é igual ou inferior a 1%”, destaca.
O agressor, preso em flagrante, está detido na carceragem da 15ª DP, à disposição da Justiça. Ele será indiciado por dupla tentativa de homicídio qualificado, por motivo torpe, e cada caso poderá render pena de 12 a 30 anos.