MPDFT registrou um aumento de 59% nas denúncias de injúria racial e racismo comparado com o ano passado
Dizem que no Brasil não existe racismo e, quando acontece, esse crime é velado. Será? A cultura brasileira está impregnada de termos pejorativos: “dia de branco”, “serviço de preto”, “a coisa está preta”, “mercado negro”, “inveja branca” e por aí vai. De acordo com o Censo 2010, mais de 50% da população brasileira é formada por pardos e negros, entretanto, a proporção é desigual em vários aspectos*: quase 80% de todos os assassinatos no Brasil tiveram como vítimas pessoas negras; 60% dos presos são negros ou pardos e, em 98% das cidades brasileiras, morrem mais negros do que brancos. Quando falamos em educação, o problema persiste: 71% dos analfabetos são negros ou pardos.
Diante dessa realidade, o Núcleo de Enfrentamento à Discriminação (NED) do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) luta para conscientizar a população sobre a necessidade de se combater todas as formas de discriminação, seja racial, religiosa ou por orientação sexual. Voltada à questão racial, a atuação do Núcleo permitiu um aumento de 59% no número de denúncias por crimes de injúria e racismo, em 2015, comparado com o ano anterior.
Denúncias – Das últimas quatro denúncias ajuizadas pelo NED, todas ocorreram no ambiente de trabalho. Duas ocorrências foram em Brasília, uma com um motorista e a outra com um cobrador de ônibus. Ambos foram ofendidos por passageiros. O outro caso aconteceu por meio de mensagem instantânea em um grupo de trabalho de funcionários da Caesb. O autor dirigiu inúmeras ofensas à vítima, utilizando-se, dentre outros insultos, das expressões discriminatórias “macaco”, “macaquinho” e “baianinho”. Na última denúncia, o crime ocorreu em uma escola da Vila Roriz, em Planaltina, quando uma aluna ofendeu o diretor do colégio.
Um termo muito utilizado pelos autores de crimes raciais é “macaco”. Segundo o promotor de Justiça Thiago Pierobom, coordenador do NED, ao se utilizar dessa expressão os acusados afirmam que a vítima se parece com o ser humano, mas não é, e possui uma inteligência limitada. “Essa expressão tem sido historicamente utilizada no Brasil como uma ofensa direcionada a negros, destinada a reforçar o estereótipo de sua subalternidade social, tratando-se, claramente, de uma ofensa à honra que faz referência à cor e à raça da vítima”, destaca.
Igualdade racial – Conscientizar é o melhor caminho. Desde 2014, o NED realiza o curso “Conscientização sobre racismo e preconceito racial” para os autores de crimes raciais em cumprimento de suspensão condicional do processo, em parceria com o governo local e a Universidade de Brasília (UnB). Em sua quarta edição, a iniciativa já contou com a participação de 52 pessoas. Segundo Pierobom, a suspensão condicional é uma solução alternativa para evitar a continuidade do processo em crimes cuja pena mínima não ultrapasse um ano. Nessas situações, o réu aceita fazer o cumprimento imediato da pena e fica sob observação da Justiça por dois anos. A proposta é tornar a palestra uma das condições legais do acordo nos processos de crimes raciais, além das exigências já existentes, como prestação de serviços à comunidade e indenização à vítima.
Injúria racial e racismo
O crime de injúria racial, previsto no Código Penal, consiste em ofender a honra de alguém com a utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem. Já o crime de racismo, previsto na Lei 7.716/89, implica em conduta discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade. Considerado mais grave pelo legislador, o crime de racismo é imprescritível e inafiançável.
Dados: Anistia Internacional, Mapa da Violência e Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE-UFRJ).