15 de Novembro de 2019
O Rei do Futebol, Pelé, concedeu entrevista à Agência Efe na qual admitiu enxergar dificuldade no combate ao racismo no futebol, como no recente caso envolvendo o atacante Taison, na Ucrânia, e também contra um segurança no Mineirão, durante o clássico do último domingo entre Atlético-MG e Cruzeiro.
Efe: Tocando em um assunto delicado, há o assunto do racismo nas últimas semanas, contra o Taison, no Mineirão. Como parar esses casos?
Pelé: No meu tempo, também existia isso, provocações. Em alguns lugares, que a gente foi jogar, na Argentina, às vezes no Uruguai, eles falavam. Isso, infelizmente, não dá para dizer que vai terminar. É impossível. Isso é coisa do ser humano, do próprio ser humano. Tem é que se estar preparado para isso. Quando nós fomos para a Suécia, na Copa de 58, eu não tinha muita experiência, estava com a seleção. Eu olhava e só tinha loira, gente branca, e falava com outros jogadores: “não tem nenhum crioulo aqui?”. Depois, todas as meninas suecas, porque acho que nunca tinham visto negro, queriam ser minhas amigas, falar. Eu disse “já melhorou”. Elas vinham conversar, brincar, porque eu era negro. Algumas passaram a mão. Na minha vida, graças a Deus, eu nunca tive problema, pelo contrário. Mas, é uma coisa triste.
Isso, infelizmente, não dá para dizer que vai terminar. É impossível. Isso é coisa do ser humano, do próprio ser humano.
Na conversa, em que mostrou muito bom humor e até brincou sobre um retorno aos gramados, Pelé garantiu estar se recuperando bem dos problemas recentes de saúde e brincou que está pagando “a conta” por uma carreira bem-sucedida e livre das graves lesões, além de ressaltar que não haverá outro como ele nos gramados, porque seus pais “já fecharam a fábrica”.
Confira a entrevista completa, na qual o Atleta do Século também falou sobre Neymar, Rodrygo, Cristiano Ronaldo e sobre os planos para o 80º aniversário, que será celebrado em 23 de outubro do ano que vem:.
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Agência Efe: Como está seu estado de saúde, depois de você ter ficado vários dias hospitalizado em abril?
Pelé: Graças a Deus, já estou bem melhor. Sempre falo para os amigos, os fãs, que eu tenho que agradecer muito a Deus, porque eu só tive os problemas de contusão, de fratura, depois que eu parei de jogar futebol. Deus só mandou a conta depois que eu parei. Graças a Deus, agora já estou me recuperando, porque eu tive problema na coluna, no quadril, de menisco, no tornozelo, mas agora já estou começando a andar bem. Mas, não dá para jogar ainda.
Efe: Em 19 de novembro serão completados 50 anos do milésimo gol. É uma data especial para você?
Pelé: Realmente, é algo importante, é um marco importante. Eu não sonhava com uma coisa dessas, foi um presente de Deus. Tudo o que aconteceu, com o milésimo gol, como foi o milésimo gol, são coisas que não tem muita explicação. Eu já tinha feito 999 gols, mas porque o milésimo gol deveria ser de pênalti? Eu ficava pensando que poderia ser normal, e foi a pior coisa para mim, a mais difícil. Antes de bater o pênalti, eu pensava “eu não posso perder”, “o goleiro não pode defender. Foi uma experiência maravilhosa.
Efe: O que você sentiu naquele momento?
Pelé: A minha preocupação, que é uma coisa que ninguém pode estar passando que eu passei, é que todo mundo acha que pênalti é fácil de bater. Mas, quando eu coloquei a bola na marca do pênalti, todo mundo começou a gritar, vibrar, e eu comecei a tremer, a ficar nervoso. Eu arrumei a bola e quando olhei, os jogadores (do Santos) estavam todos perfilados no meio de campo, aí eu pensei “e se a bola bater na trave?”, “e se o goleiro rebater?”, porque não tinha ninguém do time. O mais difícil foi isso.
Efe: O Brasil sediou recentemente a Copa América. Como foi acompanhar de longe, já que estava se recuperando? O que achou da seleção?
Pelé: Eu só fiquei triste porque fui convidado para ver a final. Era para eu ter ido, mas por causa da minha cirurgia, eu não pude ir. Acho que para o Brasil foi maravilhoso, por tudo o que aconteceu nos últimos torneios mais importantes. Foi importante para o Brasil essa vitória.
Efe: E na Copa América, o Brasil estava sem Neymar…
Pelé: Infelizmente, né? Para mim, para nós, que somos santistas, foi bem triste. Porque o Neymar é cria nossa, é cria da Vila (Belmiro), e aconteceu o que aconteceu com ele. Eu pensei: em 1966 (na Copa do Mundo), na Inglaterra, eu também machuquei, no primeiro jogo. É difícil para você, que se prepara para um torneio, para uma Copa do Mundo, mas depois acontece um desastre. É muito triste.
Efe: E como vê o momento da carreira de Neymar, os problemas no Paris Saint-Germain?
Pelé: É difícil você analisar o que acontece fora do campo. Parece que está sendo difícil para ele se readaptar à equipe, mas isso é coisa que acontece.
Efe: Agora há outro brasileiro se destacando, o Rodrygo, no Real Madrid. Como está vendo o crescimento dele?
Pelé: É um grande garoto, que ainda não conheço pessoalmente, mas muitas pessoas que estiveram com ele, me disseram que é um bom menino, que tem juízo, então espero que tenha muita sorte.
Efe: Falamos de meninos muito bons, mas nenhum atingiu o nível que Pelé alcançou. Ainda não nasceu o sucessor de Pelé?
Pelé: Todo mundo pergunta: “não apareceu alguém igual a Pelé?”. Mas, para todo mundo entender, não vai aparecer nunca outro igual a Pelé, porque meu pai e minha mãe já fecharam a fábrica. Não vai ter nenhum outro.
Efe: Cristiano Ronaldo recentemente conseguiu alcançar a marca de 700 gols, e o agente dele, Jorge Mendes, disse que irá superar sua marca de gols. Está preocupado com isso?
Pelé: Não, de jeito nenhum. Espero que ele faça muitos gols. Se puder chegar a 1.000, que chegue a 1.000 só (risos). Mas, falando sério, eu espero que ele tenha muita sorte, porque a quantidade de gols que ele tem, já é uma quantidade boa. Espero que ele tenha saúde, força, para chegar a 1.283 gols, que foi a minha marca.