O Evangelho de Bolsonaro e o fanatismo religioso no Brasil
No coração do Núcleo Bandeirante, em Brasília, uma transformação silenciosa, mas poderosa, tem se desenrolado dentro das paredes da igreja Núcleo da Fé. O pastor Wilbert Batista, conhecido como Ibi, outrora dedicado à pregação do evangelho, agora se vê no centro de um fervoroso culto político, onde a figura de Jair Bolsonaro tomou o lugar das sagradas escrituras.
O que outrora era um santuário de fé, tornou-se um palco para narrativas políticas. A mensagem de Marcos 16:15-16, “Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura”, parece ter sido substituída por uma versão adaptada: “Ide por todo o mundo, proclamai as narrativas de Bolsonaro a toda criatura. Quem crer e for batizado contra o comunismo será salvo; mas quem não crer será condenado.”
Essa distorção do evangelho não é um fenômeno isolado; é reflexo de um fanatismo crescente entre certos líderes evangélicos que, em vez de pregarem a palavra de Deus, tornaram-se porta-vozes de um projeto político.
O professor Jonatas Martins, 44 anos, é uma das muitas vozes que expressam desconforto com essa fusão entre religião e política. Frequentador assíduo da igreja Núcleo da Fé por anos, ele e sua família tomaram a difícil decisão de buscar outro lugar de culto, deixando para trás o que ele descreve como uma igreja que se desviou de sua missão espiritual.
“Ninguém em sã consciência trabalha a semana toda e, quando chega final de semana, vai para a igreja ouvir pregações políticas. Vinha com minha família para ouvir a palavra de Deus”, desabafa Martins. Sua migração para uma igreja Presbiteriana há mais de dois anos é um testemunho do que muitos fiéis têm sentido: a necessidade de resgatar a pureza da fé, longe das influências políticas que tomaram conta de alguns púlpitos.
Essa radicalização, no entanto, não se limita à igreja Núcleo da Fé. Ela é um sintoma de um movimento mais amplo que tem visto a ascensão de Bolsonaro como uma figura quase messiânica dentro de algumas comunidades evangélicas. A retórica contra a esquerda e o comunismo, frequentemente presente nos discursos do ex-presidente, foi abraçada por líderes religiosos como Ibi, que a propagam como se fosse uma extensão do evangelho.
O perigo desse fanatismo religioso é evidente. Quando a fé é cooptada por uma agenda política, ela deixa de ser um caminho de esperança e se torna uma arma de divisão. As igrejas, que deveriam ser refúgios de paz e reflexão, transformam-se em campos de batalha ideológicos, afastando aqueles que buscam apenas a comunhão com Deus.
É imperativo que os líderes religiosos reflitam sobre o verdadeiro propósito de suas vocações. A missão de evangelizar deve ser uma de amor e inclusão, não de partidarismo e exclusão. Que a palavra de Deus volte a ser o centro das pregações, e que os púlpitos sejam restaurados como locais de espiritualidade, não de disputa política.
Em tempos de polarização, é vital que a fé sirva para unir, não para dividir. O Brasil precisa de igrejas que preguem a mensagem de paz, amor e reconciliação, em vez de discursos de ódio e intolerância. Somente assim, poderemos reencontrar o verdadeiro sentido da fé cristã que não está em Lula e nem em Bolsonaro.