Da dengue aos 19: Ela perde visão e movimentos do corpo, agora respira com ajuda de aparelhos
Em 2019, aos 15 anos, Polyana Matias de Sousa desfrutava de uma vida típica de adolescente. Comprometia-se com os estudos, desfrutava de um namoro e ajudava nos afazeres domésticos, incluindo o cuidado com seu irmão mais novo e a casa.
Contudo, sua existência sofreu uma reviravolta drástica devido à dengue.
Exibindo sintomas clássicos da enfermidade, como dores de cabeça, corporais e febre, Polyana recebeu os primeiros cuidados em sua residência, sob os cuidados de sua mãe, Elisângela Maria Matias Correa, enfermeira de profissão.
Quando os sintomas se agravaram, manifestando-se com vômitos, dores abdominais e confusão mental, Elisângela decidiu levá-la à emergência de um hospital particular em Divinópolis, Minas Gerais.
“Eu reconheci que a confusão mental poderia indicar um problema neurológico e insisti para que ela fosse avaliada por um neurologista. O médico disse que era uma dengue clássica e que minha filha estava com ‘frescura de adolescente’ porque havia brigado com o namorado”, relatou Elisângela.
No hospital, enquanto aguardavam os resultados de uma tomografia, Polyana começou a ter convulsões. Apesar dos esforços médicos, incluindo a entubação e a indução ao coma para controlar as convulsões, sua condição não melhorou.
De acordo com Elisângela, sua filha passou 11 meses internada, sendo sete desses meses em coma. Houve até mesmo um momento em que os médicos consideraram sua situação irreversível.
“Após três meses de internação, os médicos afirmaram que minha filha não acordaria do coma e começaram os procedimentos para declarar morte cerebral”, compartilha a mãe.
“No entanto, naquele dia, ela teve novas convulsões e mostrou atividade cerebral novamente.”
Conforme relatado pela família, Polyana desenvolveu meningoencefalite, uma inflamação que afeta o cérebro e as meninges, os tecidos que revestem o sistema nervoso central, causada por vírus, fungos, bactérias ou parasitas.
Em resumo, o vírus da dengue afetou o sistema cerebral de Polyana, causando danos irreparáveis.
Aos 19 anos, atualmente, a estudante enfrenta a perda da visão, paralisia dos membros, dependência de respiração assistida e alimentação por sonda. No entanto, apesar das sequelas, Polyana está consciente e prossegue com seus estudos, cursando o segundo semestre de nutrição.
“A comunicação dela depende de nossa assistência. Sua audição está intacta; nós soletramos as letras e ela pisca, assim, formamos as palavras e frases que ela deseja expressar”, relata sua mãe.
Além dos sintomas comuns da dengue, como dores de cabeça, corporais, febre e erupções cutâneas, a doença pode manifestar outros sinais, como sonolência, confusão mental, desorientação, irritabilidade e até mesmo fraqueza nos membros inferiores e paralisia facial.
Essa manifestação, denominada dengue neurológica por especialistas e pesquisadores, é considerada rara e ocorre quando o vírus afeta o sistema nervoso central, seja o cérebro ou a medula.
Os danos neurológicos resultantes podem ser graves e, muitas vezes, irreversíveis.
“Quando surgem sinais de inflamação neurológica, é um sinal de que a situação é grave”, afirma Mauricio Hoshino, neurologista do Hospital Santa Catarina – Paulista.
“Sintomas iniciais, como sonolência, por exemplo, podem passar despercebidos no primeiro atendimento. Portanto, sempre enfatizo a importância de as pessoas estarem atentas a todos os sintomas e comunicá-los aos médicos. Os profissionais de saúde também devem prestar atenção especial aos pacientes com dengue”, acrescenta.
Estudos realizados por universidades brasileiras indicam que de 1% a 5% dos casos de dengue podem evoluir para doenças neurológicas.
Embora o vírus da dengue tenha quatro sorotipos distintos — DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4 —, os problemas neurológicos foram identificados principalmente nos sorotipos 2 e 3, até o momento, sem uma explicação científica definitiva para esse fenômeno.
As complicações neurológicas podem surgir tanto em casos de dengue clássica quanto hemorrágica, esta última caracterizada pela destruição das plaquetas responsáveis pela coagulação, levando a sangramentos.
Conforme os especialistas, tais complicações podem estar associadas a uma resposta hiperativa do sistema imunológico do organismo.
“A infecção pelo vírus da dengue normalmente não afeta o sistema nervoso, mas pode ocorrer a ruptura da barreira imunológica e sua penetração”, explica Yuri Macedo, neurologista do Hospital Badim.
“Essa ruptura pode ser resultado de alguma falha nas células de defesa, como uma doença autoimune, por exemplo.”
Além disso, os neurologistas afirmam que não há um fator de risco específico para a invasão do sistema nervoso pelo vírus, mas algumas comorbidades podem aumentar a suscetibilidade.
“Pessoas com imunidade comprometida e doenças autoimunes podem ser mais vulneráveis a essas complicações devido à sua imunidade reduzida”, acrescenta Hoshino.
As principais manifestações neurológicas causadas pelo vírus da dengue e seus sintomas incluem:
- Encefalite (inflamação do cérebro): redução da consciência, sonolência, convulsões e fraqueza;
- Mielite (inflamação da medula): fraqueza muscular, principalmente nas pernas, resultando em dificuldade para andar;
- Meningite (inflamação das meninges): dor de cabeça, irritabilidade, náuseas e rigidez no pescoço;
- Meningoencefalite: sintomas combinados de encefalite e meningite, considerados mais graves devido à inflamação adicional, podendo levar à lesão medular e à perda de movimento nos membros, principalmente nos membros inferiores;
-