Documento de José Aguinelo dos Santos aponta que ele nasceu em 1888, no Ceará, morreu aos 129.
Um homem com 35 anos de idade tem apenas 1,5% de probabilidade de morrer nos 10 anos seguintes. Mas o mesmo homem com 75 anos tem 45% de probabilidade de morrer antes de atingir 85.
É claro que o avanço da idade é ruim para a nossa saúde. Mas, olhando pelo lado bom, fizemos progressos sem precedentes na compreensão dos mecanismos fundamentais que controlam o envelhecimento e as doenças da idade avançada.
Alguns processos biológicos intimamente relacionados — às vezes chamados de “sinais do envelhecimento”, incluindo o suprimento de células-tronco e a comunicação entre as células — agem para nos manter saudáveis nos primeiros anos das nossas vidas. Os problemas surgem quando eles começam a falhar.
Existem exames clínicos em andamento para verificar se é possível cuidar de alguns desses sinais para o tratamento de nefropatia diabética, aspectos das funções imunológicas e fibrose pulmonar relativa à idade, entre outras condições.
Até aqui, tudo bem. Mas, infelizmente, ainda existem grandes perguntas sem resposta na biologia do envelhecimento.
Para avaliar essas questões e como abordá-las, a Federação Norte-Americana para a Pesquisa do Envelhecimento — uma organização beneficente — promoveu recentemente uma série de reuniões com médicos e cientistas de ponta. Esses especialistas concordaram que o grande desafio atual é compreender o que há de especial com a biologia das pessoas que sobrevivem por mais de um século.
Essas pessoas centenárias correspondem a menos de 0,02% da população do Reino Unido, mas elas excedem a expectativa de vida dos seus pares em quase 50 anos (os bebês que nasceram na década de 1920 tipicamente tinham expectativa de vida de menos de 55 anos). Como eles conseguem isso?
Sabemos que os centenários vivem muito porque são incomumente saudáveis. Eles permanecem com boa saúde por cerca de 30 anos a mais que a maioria das pessoas e, quando eles finalmente ficam doentes, é por tempo muito curto.
Essa “redução da morbidade” claramente é boa para eles, mas também beneficia a sociedade como um todo. Nos Estados Unidos, os custos de assistência médica para um cidadão centenário nos seus dois últimos anos de vida somam cerca de um terço do custo para pessoas que morrem na casa dos 70 anos — uma época em que a maioria dos centenários não precisa nem mesmo consultar o médico.
Os filhos dos centenários, em média, também são muito mais saudáveis que a média, o que indica que eles estão herdando algo benéfico dos seus pais. Mas essa herança é genética ou ambiental?
Os centenários nem sempre se preocupam com a saúde
Seriam os centenários modelos de um estilo de vida saudável?
Para a população em geral, controlar o peso, não fumar, beber moderadamente e comer pelo menos cinco porções de frutas, legumes e verduras por dia pode aumentar a expectativa de vida em até 14 anos, em comparação com as pessoas que não têm essas preocupações.
Essa diferença é maior que a observada entre as regiões mais abastadas e as mais pobres do Reino Unido. Por isso, seria intuitivamente esperado que essas ações influenciassem a sobrevivência das pessoas centenárias. Mas, surpreendentemente, este nem sempre é o caso.
Um estudo concluiu que até 60% dos judeus asquenazes (oriundos da Europa Central e Oriental) centenários fumaram muito ao longo da vida, a metade deles sofreu obesidade pelo mesmo período de tempo, menos da metade pratica exercícios, mesmo que moderados, e menos de 3% são vegetarianos. E os filhos dos centenários aparentemente não têm maiores preocupações com a saúde que a população em geral.
Mas a incidência de doenças cardiovasculares entre eles é a metade das outras pessoas com o mesmo consumo alimentar, saúde e peso do corpo. Existe alguma coisa naturalmente excepcional nessas pessoas.
O grande segredo
Poderia ser devido a raras condições genéticas?
Este caso poderia funcionar de duas formas. Os centenários podem ser portadores de variantes genéticas incomuns que ampliam seu tempo de vida; ou eles poderão não ter variantes genéticas comuns que causem doenças e debilitações em idade avançada.
Diversos estudos, incluindo o nosso próprio trabalho, demonstraram que os centenários têm as mesmas variantes genéticas ruins da população em geral. Alguns são até portadores de duas cópias do gene comum mais conhecido que aumenta o risco de mal de Alzheimer (APOE4), mas não desenvolvem a doença.
Por isso, uma hipótese plausível para estudo é que os centenários tenham variantes genéticas benéficas raras e não uma falta de variantes desvantajosas. E os melhores dados disponíveis sustentam essa possibilidade.
Mais de 60% dos centenários possuem variações genéticas que alteram os genes reguladores do crescimento na infância. Isso significa que essas pessoas notáveis são exemplos humanos de um tipo de extensão da vida observado em outras espécies.
A maioria das pessoas sabe que cães pequenos tendem a viver mais que os grandes, mas poucos sabem que esse é um fenômeno comum em todo o reino animal. Pôneis vivem mais que cavalos e muitas linhagens de ratos de laboratório com mutações responsáveis pelo nanismo vivem por mais tempo que seus pares de tamanho normal.
Uma possível causa desse fenômeno é a redução dos níveis de um hormônio do crescimento chamado IGF-1, embora os centenários humanos não sejam necessariamente menores que as demais pessoas.
É claro que o hormônio do crescimento é necessário no início da vida, mas existem cada vez mais evidências de que altos níveis de IGF-1 a partir da meia idade são associados ao aumento das doenças da idade avançada. Os mecanismos detalhados responsáveis por esse processo permanecem desconhecidos, mas, mesmo entre os centenários, as mulheres com níveis mais baixos de hormônio do crescimento vivem por mais tempo que as demais. Elas também dispõem de melhor função cognitiva e muscular.
Mas isso não resolve o problema. Os centenários também são diferentes dos demais em muitas outras formas. Eles tendem, por exemplo, a ter baixos níveis de colesterol — o que indica que pode haver outras razões para sua longevidade.
Em última análise, os centenários são “experimentos da natureza” que nos mostram que é possível viver com excelente saúde, mesmo se você enfrentar uma herança genética perigosa e decidir não prestar atenção às mensagens das condições de saúde — mas somente se você possuir mutações raras e mal compreendidas.
A compreensão exata de como essas mutações funcionam deverá permitir aos cientistas desenvolver novos medicamentos ou outras intervenções dirigidas a processos biológicos nos tecidos certos, no momento preciso. Se isso se tornar realidade, muitos de nós talvez possamos ver a chegada do próximo século. Mas, até lá, não aceite conselhos sobre estilo de vida saudável das pessoas centenárias.
* Richard Faragher é professor de Bioenterologia da Universidade de Brighton, no Reino Unido.
Nir Barzilai é professor de Medicina e Genética do Albert Einstein College of Medicine, nos Estados Unidos.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).