10 de Julho de 2019
Eles são tão pequenos quanto o espaço de uma vaga de estacionamento.
“São os menores da América Latina”, diz Alexandre Frankel, diretor-executivo da Vitacon, empresa que está construindo microapartamentos de 10 m² em São Paulo.
Logo que o projeto VN Higienópolis chegou ao mercado, as unidades foram vendidas por aproximadamente R$ 70 mil. O prédio ainda está em construção e o lançamento está previsto para o fim deste ano.
Como nas grandes cidades os engarrafamentos se tornaram um pesadelo e os preços das moradias estão nas alturas, as construtoras estão erguendo apartamentos minúsculos em áreas centrais para jovens profissionais, estudantes e investidores, que enxergam neles uma oportunidade rentável.
Em cidades como São Paulo, Buenos Aires, Bogotá ou Cidade do México, as pessoas podem passar facilmente três horas por dia se deslocando de casa para o trabalho.
E como o salário médio não permite comprar imóveis maiores, quem mora sozinho prefere perder espaço e ganhar tempo.
Embora alguns arquitetos digam que é como trancar alguém em uma cela na prisão, outros veem os microapartamentos como uma solução com alta rentabilidade para um problema urbano que vai continuar piorando.
Os defensores da nova tendência afirmam que o fenômeno é uma resposta à dinâmica da chamada gig economy, ou economia compartilhada, em que os jovens trabalham de forma independente, têm filhos mais tarde e usam espaços de trabalho compartilhados (coworking).
Assim, os arquitetos estão projetando edifícios com microapartamentos e grandes espaços compartilhados, onde as pessoas que querem socializar podem passar boa parte do tempo.
“As pessoas dormem em seu apartamento, mas o prédio é parte da sua casa”, explica à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, Alexandre Frankel.
A empresa dele construiu vários edifícios com microapartamentos em São Paulo, mas nenhum, até então, havia batido o recorde de 10 m².
E, de fato, no futuro, ele não será capaz de voltar a construir espaços tão pequenos, porque a regulamentação não permite mais – o limite mínimo permitido hoje para as unidades é de 11 m².
“Se eu pudesse fazer menor, eu construiria”, diz Frankel.
E esse é justamente um ponto-chave: na maioria dos grandes centros urbanos, as leis não permitem a construção em uma escala tão pequena.
Embora em cidades como Tóquio, onde a densidade populacional é uma das mais altas do mundo e os preços são proibitivos, existam microapartamentos de até 8 m².
‘As cidades expulsam as pessoas’
Em outras cidades latino-americanas, os microapartamentos também estão se proliferando, mas com tamanhos um pouco maiores, que beiram os 20 m².
Embora a alta densidade populacional e o tráfego excessivo de veículos não sejam um problema novo na região, a verdade é que pioraram em muitas cidades.
E se, acrescentarmos a isso o aumento dos preços e a ascensão da classe média, temos o cenário perfeito para que o fenômeno dos microapartamentos comece a se expandir, pelo menos enquanto houver demanda para colocar lenha na fogueira.
Em Buenos Aires, também estão sendo desenvolvidos projetos imobiliários desse tipo. Alguns em bairros nobres e outros em áreas de classe média.
“Fazemos produtos para pessoas de classe média que não conseguem comprar (um imóvel), que não têm acesso à moradia”, explica à BBC News Mundo Pablo Brodsky, diretor comercial da Predial, empresa que vende microapartamentos de 18 m² a 30 m², com preços a partir de US$ 40 mil (R$ 153 mil) e US$ 50 mil (R$ 192 mil), respectivamente.
“As cidades expulsam as pessoas. É por isso que os microapartamentos são uma tendência que veio para ficar.”
Brodsky acredita, no entanto, que tudo tem um limite, ou seja, você não pode construir moradias tão pequenas quanto as de São Paulo.
“Eu não moraria em 10 m²”, diz ele.
Aluguel para turistas
Outras empresas desenvolveram projetos em áreas mais nobres, como Belgrano ou Palermo, que não têm menos de 20 m² e custam pelo menos US$ 55 mil (R$ 211 mil).
Muitos imóveis são comprados por investidores que, em alguns casos, alugam as propriedades em plataformas como o Airbnb ou até mesmo como escritórios.
“Devido à desvalorização do peso, é muito rentável alugar (os apartamentos) para turistas que pagam em dólar, em vez de alugá-los por um ano inteiro”, afirma Manuel Mel, gerente de vendas da Mel Propiedades.
Os imóveis também são comprados por pais de estudantes do interior do país que vão estudar na capital ou por jovens profissionais.
“Eles têm uma localização muito boa, estão conectados ao metrô e podem ser comprados por pessoas que teriam que esperar mais cinco anos.”
E como as regras que permitem construir microapartamentos em Buenos Aires foram modificadas há poucos meses, é possível que nos próximos anos sejam desenvolvidos mais projetos desse tipo.
‘As pessoas ainda buscam espaços maiores’
“Esse fenômeno ainda não é tangível para o caso do México”, diz à BBC News Mundo José Luis Madrigal, gerente-geral da empresa CADU Residencial.
“Há um aumento nos preços de imóveis, especialmente na Cidade do México, e uma demanda alta que a oferta não consegue assimilar.”
Mas as pessoas ainda estão à procura de empreendimentos maiores, com pelo menos 65 m².
De qualquer forma, ele argumenta, a tendência é que os espaços sejam reduzidos – não só devido ao aumento dos preços, mas também à redução do crescimento populacional e às condições de vida e trabalho atreladas à economia compartilhada.
Em alguns sites de imobiliárias, é possível encontrar apartamentos de 20 m², principalmente para alugar.
Se trata, em muitos casos, de moradias antigas reformadas, diz Leonardo González, analista do site Propiedades.com.
E há uma demanda por espaços pequenos entre membros da geração millennial, uma vez que não é fácil para eles comprar um apartamento.
“Muitos não têm uma renda garantida, tampouco condições para comprar uma propriedade”, explica.
A mesma situação se repete em todo o mundo, especialmente nas grandes cidades, onde a casa própria se tornou um sonho cada vez mais distante.
Não é à tôa que muitos profissionais recém-formados tentam ficar na casa dos pais o maior tempo possível com a ideia de economizar.
E outros, cansados de passar horas presos no trânsito, acabam preferindo os microapartamentos. Uma ideia que deixa muitos urbanistas indignados, se perguntando por que não foram feitas políticas de planejamento urbano a tempo.
Seja como for, o fato é que as megacidades continuarão crescendo e a demanda por moradia dificilmente vai desacelerar.
Cecilia Barría – BBC News Mundo